És empresário e não fazes ideia se te podes endividar - Autonomia Financeira

Se és empresário e já pensaste “quanto mais posso alavancar isto sem correr riscos”, estás a pisar terreno onde entra um indicador fundamental: a Autonomia Financeira (também chamado Rácio de Autonomia Financeira, RAF).

Este indicador ajuda-te a avaliar se a tua empresa depende muito de terceiros (bancos, investidores) ou se consegue suportar-se com os seus próprios recursos. E isso importa bastante, sobretudo nos projetos imobiliários, onde os custos são elevados e o fluxo de caixa pode sofrer oscilações.

 

O que representa a Autonomia Financeira (RAF)?

A autonomia financeira mede a proporção do capital próprio (recursos dos sócios, reservas, resultados acumulados) na estrutura total de financiamento da empresa. Em termos simples:

RAF = Capitais Próprios / Ativo Total

Ou seja: de todo o ativo da empresa (terrenos, imóveis, equipamentos, créditos, etc.), que percentagem está financiada pelos teus recursos, sem recorrer a empréstimos ou dívidas. Quando esse rácio é elevado, a empresa é menos dependente de capitais externos.

Por exemplo: se uma empresa tem 100.000 € de capital próprio e 300.000 € de ativos totais, o RAF = 100.000 / 300.000 = 0,333 ou 33 %. Isso sinaliza que 33 % do que existe é suportado pelos recursos próprios, e 67 % por terceiros (empréstimos, fornecedores, etc.).

 

Nota: Quando falamos de Capitais Próprios, não estamos a falar de dinheiro em caixa disponível, estamos a falar da rúbrica “Capital Próprio” da demonstração financeira Balanço que as empresas são obrigadas a ter.

 

Por que este indicador é tão útil para ti, empresário

1. Avaliar risco ao contrair novas dívidas


Se já dependes muito de capitais emprestados, qualquer novo crédito tornará a empresa ainda mais fragilizada. Em cenários de crise, a margem de manobra é menor e o risco de colapso é maior. Se o RAF for inferior a 30 % ou 33 %, é sinal de que “tens os pneus quase furados” financeiramente.

2. Credibilidade junto de bancos e investidores


Um RAF elevado transmite solidez. Ao pedir financiamento para obra, reabilitação ou aquisição de terreno, instituições de crédito vão olhar para esse indicador para decidir condições (taxa de juro, prazo, garantias).

3. Resiliência em períodos de stress


Se o mercado imobiliário recuar, se aparecerem atrasos em pagamentos ou custos imprevistos, uma empresa com boa autonomia financeira suporta melhor o stress financeiro e evita as “aflições de caixa”.

 

Quais os limites de referência?

Não há um valor absoluto que sirva para todas as empresas, depende do setor, do risco, do modelo de negócio, mas aqui vão orientações frequentemente usadas:

  • RAF inferior a 30–33 %: indicativo de dependência excessiva de capital alheio.

  • RAF entre 30 % e 60 %: faixa considerada saudável para muitos negócios.

  • RAF muito alto (> 60 %): pode indicar sobressuficiência de capital próprio, ou seja: estás a deixar de aproveitar alavancagem prudente que poderia aumentar retorno dos teus investimentos.

Em algumas portarias e regulamentos públicos, para empresas maiores, exige-se níveis mínimos de autonomia financeira (por exemplo, rácio não inferior a 0,20 em certas partes da legislação).

 

O que fazer se a tua autonomia financeira for baixa?

Se vires que o teu RAF anda por valores baixos, aqui estão caminhos para reforçá-lo:

  • Reforçar capitais próprios:

    Entrada de novos sócios, aumento de capital, retenção de lucros (não distribuir dividendos).

  • Convertendo dívida de curto prazo em médio/longo prazo:

    Reestruturar empréstimos curtos em prazos mais longos reduz pressão imediata e permite “respirar”.

  • Diminuir novos investimentos que dependam de financiamento externo

    Fazer só o que cabe no orçamento próprio até recuperar equilíbrio.

  • Reduzir endividamento existente

    Priorizar amortizações em dívidas com juro elevado, renegociar passivos.

 

Um exemplo aplicado ao setor imobiliário

Imagina uma construtora que atua no mercado de reabilitação urbana.

  • Situação inicial:
    Ativos totais: 2.000.000 €
    Capitais próprios: 400.000 €
    RAF = 400.000 / 2.000.000 = 0,20, ou seja, apenas 20 % do ativo está coberto por recursos próprios, o resto financiado.

  • Interpretação:
    Um RAF de 20 % é considerado baixo, a empresa está bastante dependente de financiamento externo. Se tentar contrair um novo empréstimo grande para fazer obra, pode ser rejeitada ou sujeita a garantias duras ou taxas elevadas.

  • Melhorias recomendadas:

    1. Retenção de lucros nos próximos 2‑3 anos para aumentar os capitais próprios.

    2. Converter parte das dívidas de curto prazo em prazos mais longos.

    3. Evitar investimentos agressivos que dependam fortemente de crédito.

Se, dentro de dois anos, a empresa conseguir elevar o capital próprio para 800.000 €, mantendo o ativo em 2.000.000 €, o RAF sobe para 40 %, muito mais confortável, com maior margem de manobra para investir.

 

Conclusão

Se és empresário e nenhuma vez paraste para calcular se “podes” realmente contrair mais dívida, calcula o teu RAF. É um semáforo financeiro, ou seja, mostra até que ponto podes te alavancar sem te expor demais. Um RAF baixo (abaixo de 30‑33 %) indica que estás no limite de dependência financeira. Um RAF saudável (entre 30 e 60 %) dá-te margem para crescer e investir com segurança.

No imobiliário especialmente, onde os projetos podem ser longos, os custos altos e os atrasos frequentes, saber quanta “margem de endividamento” tens já é meio caminho andado para evitar surpresas indesejadas.

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